quarta-feira, 2 de setembro de 2009

Desabafo infantil

Há de se tomar receio com certas convencionices teatrais atuais que estão submergidas, às escondidas, por sob interesses ainda escusos. Teatro é e deve sempre ser, em seu cerne, para divertir, seja para quem o faz como para quem o assiste. Mesmo que o texto, tema, a dramaturgia trabalhada seja trágica, o evento, o acontecimento no palco e do palco devem ser prazerosos. Antes de ser profissão, deve ser entretenimento e isso, preponderantemente, não tem nada que ver com compromisso, respeito, disciplina ou responsabilidade de quem o pratica/estuda. Não pode ser “sofrido”, “doloroso”, “penoso”, como tantos reverberam por ai. Isto é autoflagelação ou até masoquismo, coisas que podem ser retratadas pela arte e não vividas nela e por ela.

Que a arte é transformadora, visceral e potente, não há dúvida. Mas, por vezes, devemos ter a consciência de que tudo isso é uma ilusão, um placebo que inventamos para sobrevivermos em meio a tantos não saberes, a tantas perguntas sem resposta, a tantos não para mirrados sim. E não sei por que miolos de pombo tentamos transformar a arte em algo sublime, metafísico, uma responsabilidade e respeito, ao meu prisma, extremamente demasiados em alguns casos. Não acredito que haverá – se é que existe um haver –, epifanicamente, alguma punição divina que recairá sobre aquele que não ceder aos preceitos mundanos atuais de respeito a esta arte ou a qualquer outra. E esta opinião, acreditem, é quase uma heresia para alguns.

E reafirmo: isto não deve explicações sobre responsabilidades, deveres ou, pelo menos, não mais (ou talvez um pouco mais) do que qualquer outra profissão. Digo isto tudo, pois corriqueiramente sou atravessado por uma lembrança de um grande professor que tive, mas que têm eco em várias outras pessoas, quiçá a maioria delas. Em suas, e em outras, palavras: “se a doença lhe acometer, se sua família, amigos ou, por algum motivo, algo lhe impossibilitar inicialmente de apresentar o espetáculo, isto não interessa. Engula a dor, seque as doenças, estanque a angústia, você deve subir ao palco com o caixão debaixo do braço”.

Ora, se isto é fazer arte, ela que me desculpe, mas vou ser padeiro, engraxate, tecelão, empresário ou qualquer outra profissão que não me constranja nessas questões (se é que estas também não podem ser tratadas como algum tipo de arte, cada uma com sua presteza específica). É necessário desmistificar. Que não consigo fazer outra coisa, que acredito que essa coisa que faço é de extrema importância, que penso, vivo e redivivo pelo Teatro, são fatos inexoráveis. Que vivenciamos sensações indescritíveis, que refletimos sobre nossa existência enquanto humanos e indivíduo, que saboreamos cada instante do nosso oficio, também é inegável. No entanto, o deslumbre, a persistência no trabalho, o respeito com a profissão, não podem exacerbar a consciência, vendar nossos olhos.

Nisto, colho mais flores e frutos nas palavras de Picasso: “Passei quase minha vida inteira para voltar a aprender a pintar como uma criança”. Assim, o que deve haver, em muitos casos, não é um respeito com a arte, mas um respeito da arte comigo, seu servo, cavalo, sua massa de modelar a realidade e a ilusão, o tempo e o espaço, o sentido e a razão. Mas que não recaia sobre nós atores fardo maior do que precisamos carregar.

4 comentários:

  1. Uau! Que blog reflexivo!
    E se for preciso sofrer para se fazer teatro, que soframos como palhaços!

    ResponderExcluir
  2. viva gente! vida moderna é isso aí! saudades de vcs todos e desse espírito livre que o trabalho prazeroso nos faz cultivar.
    nos encontramos pela rede! um beijo léo e mari da carol

    ResponderExcluir
  3. Merkur 37C Safety Razor Review – Merkur 37C
    The Merkur 37c www.jtmhub.com is an excellent short handled DE wooricasinos.info safety razor. It is more https://deccasino.com/review/merit-casino/ suitable for both heavy and gri-go.com non-slip hands and is therefore poormansguidetocasinogambling a great option for experienced

    ResponderExcluir