terça-feira, 29 de novembro de 2011

Desabafo Infantil 4

Como estamos próximos da estreia de nosso novo espetáculo, “Como a Gente Gosta”, baseado na obra de Shakespeare, queria elucidar uma associação que, por anos, nos persegue. Não fazemos teatro apenas para o público infantil. Somos um grupo que trabalha com a linguagem do teatro de rua, ou seja, que tem como espectadores os indivíduos deste espaço, moradores de rua, adultos, crianças, idosos, adolescentes e todo tipo de classe social e econômica que uma sociedade como a nossa abrange. Dito isto e tendo em vista nossa próxima montagem, oxalá que esta referência, de teatro para criança, seja não renegada, mas expandida, compreendida como uma das possibilidades entre os enormes leques criativos de linguagem, gênero e estética que acompanham nosso ofício.

Esta fala pode sim ser notada como um desabafo. Não pela negação de um trabalho que, factualmente, nos orgulhamos, desenvolvemos e exercitamos com o público infantil, mas pela ignorância e dispêndio em acreditar que esse é nosso único objetivo de encenação. Evidentemente que trabalhar com a linguagem do palhaço, principalmente em nosso país, é caracterizado por, preponderantemente, intentar abordar somente espectadores criança - posto que seja um gênero cômico que, para muitos, é o mais fácil e pueril dentre as pesquisas estéticas teatrais. Ou seja, torna-se ou é tomada, em certa medida, como uma arte menor, tanto o trabalho com este público como a pesquisa com o palhaço. Estes pensamentos evidenciam não só uma absoluta ignorância e burrice (sob o prisma de que a pessoa insiste em permanecer na ignorância) sobre estas linguagens, mas também um preconceito com a tradição popular, berço de toda a cultura disso que denominamos arte chamada Teatro.

Assim, as inúmeras montagens atuais que desprezam ou menosprezam a presença e intelectualidade do público daquilo que está sendo dito em um espetáculo, causando um constrangimento de compreensão por parte deste, poderia ser motivo suficiente para também engendrar um pensamento similar ao “teatro cabeça”. No entanto, mesmo por acreditar que uma obra ao ser feita deve se preocupar com o seu resultado e não somente com o seu processo, posso pensar que, quiçá com os anos, esse verbete (Maria Cutia = espetáculo para criança), seja revisto e ampliado, assim como o pensamento e falas de quem o diz.

Destarte, não me venham falar que somos um grupo "bonitinho" ou que temos muita "sorte" por ganharmos prêmios como os dois últimos que recebemos (Artes Cênicas na Rua 2011 e Myriam Muniz 2011). Isto é fruto de trabalho, competência, profissionalismo, entrega e, mais que tudo, cumplicidade. 

Leonardo Rocha.

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